Secretaria Municipal de Cultura e Economia Criativa
A maldição do rap
Rappers X polícia. Conflito na Praça da Sé pode acirrar uma rivalidade antiga que parecia estar adormecida
Caio Quero e Thaís Kuzman
O rap brasileiro vivia um momento único. Antes restrito às periferias e visto com uma certa desconfiança por uma parcela da sociedade, o estilo que mistura um discurso rimado com crítica social contundente estava saindo do gueto para ganhar rádios e boates da moda. Mas uma tragédia pode colocar tudo a perder: será que depois do choque entre a polícia e os fãs dos Racionais MCs durante show na Praça da Sé como parte da terceira edição da Virada Cultural o preconceito contra o gênero pode voltar?
Os integrantes dos Racionais preferem não se pronunciar sobre o fato. “Não temos nada para falar. Esse assunto é interno, a gente ainda tem que trocar uma idéia. É melhor, assim as coisas vão ficando mais no chão. Mais na frente a gente pode falar”, disse o rapper KL Jay em entrevista ao JT por telefone.
A confusão fez com que a Prefeitura programasse uma ‘viradinha’ cultural para sábado, na Praça da Sé, a partir das 16h, com Karnak, Pato Fu e Teatro Mágico. Quanto a Racionais, o secretário de cultura Carlos Augusto Calil diz o seguinte: “Temos que ajustar o artista ao local. Foi um erro programar o show dos Racionais para a Praça da Sé.”
Já entre as personalidades ligadas ao rap, a opinião é de que houve uma intolerância por parte da polícia durante a apresentação que terminou em pancadaria. Figura próxima aos Racionais, Paulo Magrão, vice-presidente da ONG Capão Cidadão, é incisivo: “Havia pessoas em cima de uma banca de jornais desde os outros shows da Virada. Quando deu dez minutos de apresentação, a Polícia quis tirar o pessoal.”
Magrão compara a perseguição contra o rap com os percalços pelos quais passavam os sambistas no início do século 20, quando eram proibidos pela polícia de se manifestarem. Em sua opinião, o incidente de domingo não pode desencorajar a Prefeitura a fazer outros shows de rap. “A prefeitura teria que fazer shows para educar os meninos”.
Pioneiro do hip hop, o MC Thaíde não acha que o incidente seja capaz de piorar a visão contra o rap. “Isso não é uma coisa que seja culpa dos Racionais porque eu não vi ninguém deles subir no palco para desacatar autoridade. Isso vai fortalecer ainda mais a nossa vontade”.
Dentro do mundo do rap, há ainda o time daqueles que não querem comentar o assunto. Procurados pela reportagem, Rappin Hood, Negra Li e os integrantes dos grupos U Time e Rosana Bronks, apadrinhados pelos Racionais, preferiram não tecer comentários.
Para o senador Eduardo Suplicy (PT-SP), outra testemunha ocular do incidente, as críticas que os Racionais fazem à polícia em algumas canções não devem ser motivo de uma rivalidade entre as duas partes. “Eles são um fenômeno que todos devemos conhecer. Se é fato que eles são críticos de algumas das ações da PM, isso não quer dizer que ela deva reagir da forma exagerada que eu testemunhei”, diz ele, que promete tentar promover um encontro entre os Racionais e o comandante da PM. “Assim no próximo show pode haver um melhor procedimento de todos.”
Do outro lado
O Comandante do Comando de Policiamento da Capital, Coronel Ailton Araújo Brandão acredita que o rap dos Racionais não gerou a violência na Praça da Sé. “A obrigação da PM é garantir que o evento aconteça. Se as músicas falam de algum assunto de violência, isso deve ser analisado separadamente”, diz ele, que frisa que a ação da polícia no caso não foi abusiva. “Não houve nenhuma queixa de agressão no tumulto.”
Trecho da música
‘Homem na Estrada’
Racionais Mcs
“A Justiça Criminal é implacável. Tiram sua liberdade, família e moral.(...)
Não confio na polícia, raça do car...
Se eles me acham baleado na calçada, chutam minha cara e cospem em mim...eu sangraria até a morte...
Já era, um abraço!”
A avalanche de tiros do rap americano
Na década de 1990, gangsta rap norte-americano foi cenário de acusações e mortes de alguns dos seus principais nomes, como Tupac
Marco Bezzi
Tiros, bandidagem e música rimada. Quando o gênero tachado como gangsta rap metralhou as paradas de todo mundo no início dos anos 1990, pais e mães norte-americanos novamente tinham o que temer. “Não quero matar ninguém, mas eles me deixaram sem saída/Me caçando enquanto eu to no rolê, falando pelas minhas costas”, dizia uma das letra do rapper Tupac Shakur, um dos chefões da Costa Oeste, morto em 1996.
Tupac foi o maior nome do movimento - e deu crias como o rapper 50 Cent. Até hoje, muitos duvidam da morte do ‘James Dean do rap’. Tupac foi metralhado dentro de sua limusine enquanto saia de uma luta de Mike Tyson, em Las Vegas. O rapper lançou apenas cinco álbuns e, curiosamente, mais sete apareceram depois de sua morte. Será que Chico Xavier tem sua versão hip hop nos Estados Unidos? No documentário Tupac: Ressurection, de 2003 (mais um trabalho póstumo), o cantor narra sua própria morte! Sabendo que iria para uma melhor, se trancou no estúdio e fez uma maratona de composições.
Assim como Elvis Presley, a morte de Tupac gerou inúmeras dúvidas e teorias conspiratórias. Além de ter sido preso algumas vezes (acusado de estupro, desacato a autoridade, porte de arma ilegal), mais uma de suas façanhas foi levar cinco tiros no peito em 1994 e sobreviver para contar a história de que Notorius B.I.G. e Puff Daddy (hoje P. Diddy), dois rivais da Costa Leste, haviam armado para ele.
Já 50 Cent adotou os dogmas de seus ídolos do gangsta. Montou sua turminha em Nova York, jurou de morte o rapper Ja Rule e teve a capacidade de levar nove tiros (!) e sobreviver. 50 Cent já havia acusado P. Dyddy de saber da armação que ocasionou a morte de Notorius B.I.G., alegando que o “parceiro” só queria lucrar com o assassinato do gordão. Hoje, os dois conseguiram resolver suas diferenças, algo que Tupac - certamente - não aprovaria.
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