Secretaria Municipal de Cultura e Economia Criativa

São Vito é invadido

Fonte: Jornal da Tarde

Sem-teto ocupam prédio, mas são retirados pela PM

ALVARO MAGALHÃES, alvaro.magalhaes@grupoestado.com.br

O Edifício São Vito, no Centro da Capital, ao lado do tradicional Mercado Municipal, foi invadido por um grupo de sem-teto, ontem de madrugada. A polícia chegou e depois de duas horas de tensão e conflitos, os invasores cederam. Cerca de 300 pessoas, inconformadas com o fim do benefício do bolsa-aluguel e com o projeto de demolição do prédio, ocuparam o local.

'Na calada da madrugada a polícia invadiu o prédio', queixava-se Hamilton Silvio de Souza, 44 anos, um dos líderes dos sem-teto que promoveram a invasão. 'Foi uma ação completamente ilegal. Aliás: inconstitucional', prossegue. 'A Constituição diz que a casa é um asilo inviolável. Nós já estávamos dentro do prédio, já tínhamos constituído moradia. A polícia só poderia entrar com um mandado ou com um pedido de socorro', dizia o invasor.

Souza é coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto da Região Centro (MTST-RC), um das principais organizações que compõem a Frente de Luta por Moradia (FLM). A invasão reuniu oito siglas filiadas à FLM. E, segundo outra líder - Felícia Mendes Dias, 48 anos, do Fórum de Moradia e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Fommaesp) - mais de 300 pessoas.

À 1h30, a maior parte dessas pessoas estava encurralada no interior do velho prédio, de 26 andares. Pouco antes, os invasores tinham arrebentado os blocos de concreto que fechavam a entrada do antigo treme-treme, desocupado pela prefeita Marta Suplicy em 2004. Conforme os líderes da FLM, a polícia chegou em seguida e deu meia hora para que a ocupação fosse abortada.

Pedradas e bombas

Algumas lideranças disseram que tentaram convencer os invasores a deixar o local. Mas uma meia dúzia de jovens provocou os policiais militares. Pedradas foram lançadas contra os soldados pelos adolescentes que estavam no meio da Avenida Mercúrio, na frente do prédio. Os policiais revidaram com bombas. Houve gritaria. Os ataques contra a polícia passaram também a vir de cima. Moradores do edifício vizinho ao São Vito se solidarizavam com os invasores. A polícia passou então a atirar para o alto.

Bombas, movimentação da tropas, pedradas, vidros estilhaçados. Tudo isso pouco antes da 1h30. Após alguns minutos, a ofensiva policial foi suspensa. O invasores também se aquietaram.

O pequeno Juliano Miranda do Nascimento, 12 anos, diz que foi nessa hora que ele pisou num prego. Segundo ele, seus pais estavam longe, num prédio da Rua Mauá invadido há duas semanas. No São Vito, só ele e seu irmão menor, Giovane Miranda do Nascimento, 8 anos. 'Ele ficou sem ar por causa da bomba de gás', disse o mais velho, apontando para o menor. 'O olho dele ardia e ele não parava de chorar.'

Drama e solidariedade

Alguns andares acima, com o rosto sangrando, José Alcimar, 31 anos, diz que pensava em se jogar pela janela. 'Eu só tenho um filho, moro na rua. Ainda consegui matri culá-lo numa escola. Mas, na rua, o que eu posso mais fazer para ele?', perguntava ele, desempregado desde 2002, quando deixou uma fazenda onde cuidava de flores, em Juquiá, Interior do Estado. 'Não consigo nem lavar uma roupa!' José Rubens Rodrigues da Silva, 22 anos, confirma: 'Ele queria se matar mesmo. Eu e minha mulher impedimos.'

Do lado de fora do prédio, àquela altura, havia também muita tensão. Encostada numa muretinha, Carmen Silva Ferreira, 46 anos, segurava um bebê de menos de 1 ano no colo. Ela nem sabia o nome da criança. No auge do confronto, o menino - com dificuldade respiratória por causa das bombas - foi retirado pela janela do mezanino do prédio, a uma altura de 4 metros. Um desconhecido agarrou-o e o entregou a Carmen.

Nova ofensiva

À 1h50, a polícia voltou à ofensiva. Primeiro, um estouro dentro do prédio. Dois carros do Corpo de Bombeiros chegaram em seguida. Era um sinal de que poderia haver feridos no confronto. Cinco minutos depois, outra bomba estourou. 'Vocês não têm idéia de como é ouvir o eco de bomba lá dentro', disse Lúcia Holanda, 55 anos.

Alguns soldados entraram no prédio. Pouco a pouco, os invasores foram saindo. Uma parte ficou, uns 50 a 60, com as lideranças, na calçada, diante do prédio.

EM NÚMEROS

1,2
milhão
de pessoas moram em favelas na Capital

1,6
milhão
de pessoas vivem em loteamentos clandestinos ou irregulares

600
mil
estão morando em cortiços na Cidade

3,41
milhões
de pessoas moram em habitações precárias

2.018
é o número total de favelas distribuídas em toda a Capital paulista

*FONTE: IBGE