Secretaria Municipal da Saúde
Doenças Raras: Saúde da capital oferece testes genéticos para recém-nascidos e demais faixas etárias
O Ministério da Saúde estima que cerca de 6% da população possui algum tipo de doença rara. Estatisticamente, são consideradas doenças raras as condições que afetam menos de 65 pessoas em uma população de 100 mil habitantes o que, na cidade de São Paulo, equivaleria a 720 mil pessoas. Vale ressaltar que, embora sejam consideradas raras individualmente, todas estas doenças juntas somam cerca de sete mil diferentes condições.
Doenças raras também são caracterizadas geralmente como doenças crônicas, degenerativas e que comprometem significativamente a qualidade de vida dos pacientes. Além disso, podem se manifestar com uma variedade de sintomas que se confundem com doenças comuns, dificultando o diagnóstico e causando sofrimento tanto para o indivíduo quanto para a família. A estimativa é de que 80% destas doenças raras têm causas genéticas e outros 20% podem ter causa infecciosa, inflamatória ou autoimune.
Para conscientizar sobre essas doenças, no último dia de fevereiro é celebrado o Dia Nacional de Conscientização das Doenças Raras.
Seguindo a Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras (PDR), de 2014, em 2019 a Secretaria Municipal da Saúde (SMS) instituiu o Programa de Apoio às Pessoas com Doenças Raras e seus familiares, além da criação de uma área técnica, designação de interlocutores para os territórios e a sensibilização dos profissionais da rede para as doenças raras. O objetivo é ajudar a tornar o diagnóstico mais rápido, além de acolher as famílias de uma maneira mais adequada.
Clique aqui para ver a página do Ministério da Saúde sobre o fluxo de cuidados às pessoas com doenças raras nos vários níveis de assistência.
Teste do Pezinho é o primeiro passo para o diagnóstico
Como forma de apoio a crianças com doenças raras, a Secretaria Municipal da Saúde (SMS) oferece, em parceria com o Instituto Jô Clemente (IJC) e a Fundação Jeffrey Modell, testes genéticos de última geração para crianças diagnosticadas com erros inatos do metabolismo e da imunidade detectados no teste do pezinho ampliado.
Desde dezembro de 2020 a SMS ampliou, de forma gradativa, o diagnóstico para doenças triadas pelo teste do pezinho, além de acesso a exames confirmatórios e agendamento de consulta com especialistas, a fim de assegurar a linha de cuidado para cada doença. Atualmente, todos os recém-nascidos na rede municipal de saúde passam por um exame que detecta 27 doenças, enquanto nos bebês sintomáticos ou internados em unidade de terapia intensiva (UTI) neonatal é feito o teste ampliado para 50 doenças.
“O teste do pezinho é de extrema importância para a saúde e qualidade de vida das crianças”, enfatiza Athene Maria de Marco França Mauro, médica pediatra e responsável pela Área Técnica de Saúde da Criança da Coordenadoria de Atenção Básica da SMS.
Vale lembrar que o escopo original da triagem neonatal detecta seis doenças: fenilcetonúria, hipotireoidismo congênito, doença falciforme e outras hemoglobinopatias, fibrose cística, hiperplasia adrenal congênita e deficiência de biotinidase. A ampliação permite a detecção de outras condições como toxoplasmose congênita, erros inatos do metabolismo e imunidade.
“A maior contrariedade acerca dessas doenças é a dificuldade no diagnóstico. No caso das doenças diagnosticadas no teste do pezinho, de modo geral, as crianças aparentam ser saudáveis ao nascimento, e na evolução se não diagnosticadas e tratadas precocemente podem apresentar atraso no desenvolvimento físico e/ou intelectual. Por isso, o teste do pezinho ampliado tem extrema importância, já que indica os pacientes com essas doenças ou, pelo menos, com suspeitas, que são confirmadas posteriormente com testes especializados, entre os quais o teste genético”, explica Athene.
Em 2024, um total de 80.370 mil crianças nasceram na rede pública da capital e passaram pelo teste do pezinho ampliado. Na rede municipal, de 2021 a 2024, foram realizadas 339.379 triagens neonatais expandidas, que deram origem a 478 testes metabólicos, 952 testes imunológicos e 743 testes genômicos confirmatórios.
Saiba mais sobre algumas das condições mais frequentes detectadas pelo teste:
Hipotireoidismo congênito – é a deficiência de hormônio tireoidiano no nascimento e que, se não for tratado precocemente, pode levar à falha de crescimento e deficiência intelectual permanente.
Hemoglobinopatias - são doenças genéticas que afetam a estrutura ou a produção das moléculas de hemoglobina, e que se manifestam por exemplo como diferentes tipos de anemia. A Doença Falciforme é a condição mais frequente desse grupo. Na Secretaria Municpal a Área Técnica da Saúde da População Negra foi responsável pela elaboração de uma linha de cuidado para a condição, que acomete principalmente pessoas negras e pode afetar sua qualidade de vida de forma severa.
Fibrose Cística - é uma doença genética rara que afeta principalmente os pulmões, pâncreas e o sistema digestivo, a condição leva a produção de secreções espessas e pegajosas, obstruindo os pulmões e outros órgãos.
Hiperplasia Adrenal Congênita - é uma doença genética rara que afeta a produção de hormônios pelas glândulas adrenais.
Toxoplasmose congênita - é uma infecção que ocorre quando o parasita Toxoplasma gondii é transmitido da mãe para o feto durante a gestação; pode causar lesões oculares, viscerais ou intracranianas.
Deficiência de G6PD – a deficiência de glicose-6-fosfato desidrogenase (G6PD) é uma doença genética que impede o corpo de produzir a enzima G6PD, responsável por proteger os glóbulos vermelhos, gerando sintomas como anemia e icterícia.
Erros inatos da imunidade (EII) – são doenças genéticas raras que afetam o desenvolvimento e a função do sistema imunológico, também conhecidos como imunodeficiências primárias. Uma das condições triadas é a imunodeficiência combinada grave (SCID).
Erros inatos do Metabolismo (EIM) – são doenças genéticas raras que afetam diversas vias metabólicas do organismo. No teste básico se incluí a fenilcetonúria e a deficiência de biotinidade. No teste ampliado se incluí outras doenças metabólicas como Galactosemia e Distúrbios de Beta-oxidação Mitocondrial dos Ácidos Graxos.
Capital estendeu testes genéticos a outras faixas etárias
O geneticista Carlos Eugênio Fernandez de Andrade, assessor técnico responsável da Área Técnica de Doenças Raras da Coordenadoria de Atenção Básica da SMS, lembra que a atenção às pessoas com doenças raras na rede municipal transcende o teste do pezinho.
“Além do diagnóstico, o tratamento das doenças raras também costuma ser um desafio, pois depende de uma rede de cuidados estruturada focada na melhoria da qualidade de vida dos pacientes, uma vez que muitas destas condições ainda não possuem medicamentos desenvolvidos para elas. Dessa forma, é necessário acompanhamento multiprofissional com o objetivo de aliviar os sintomas ou retardar a progressão da doença”, acrescenta.
Na rede municipal, pessoas com suspeita ou diagnóstico de deficiência intelectual ou transtorno do espectro autista sindrômico passam por avaliação das equipes de saúde da Atenção Básica, dos Centros Especializados em Reabilitação (CERs) e dos Centros de Atenção Psicossocial (Caps). Para pacientes com este perfil que necessitem avaliação multiprofissional mais especializada, inclusive por médico geneticista, a rede municipal disponibiliza desde 2022 testes genômicos para suporte ao diagnóstico.
Desde 2024 a rede municipal oferece também atendimento com médico geneticista no Hospital Dia Flávio Gianotti para pessoas sem deficiência intelectual ou TEA sindrômico. Caso o paciente necessite teste genômico, é encaminhado para o IJC em vaga específica de investigação diagnóstica em doença rara. Após o resultado, a pessoa retorna para o HD, onde se conclui o procedimento de aconselhamento genético, de forma que haja o melhor entendimento do resultado do teste, do diagnóstico, do impacto que pode causar e do tratamento indicado.
De 2022 a 2024 a rede municipal realizou 1.332 testes em crianças e adultos, sendo os mais frequentes o sequenciamento do exoma completo (exame genético que analisa a região do DNA responsável pela codificação de proteínas, utilizado para identificar alterações genéticas associadas a doenças), com 637 exames, SNP Array/CGH Array (utilizados para investigar síndromes genéticas associado a deficiência intelectual, autismo ou anomalias congênitas como a Síndrome de Williams), com 419 exames, e análise molecular de DNA através da tecnologia do PCR (Reação em Cadeia da Polimerase) com 240 exames, capazes de detectar condições como a Síndrome do X-frágil (principal causa genética de deficiência intelectual após a síndrome de Down) ou a doença de Huntington, condição genética, hereditária e neurodegenerativa que afeta o sistema nervoso central e atinge geralmente pessoas na idade adulta entre os 30 e 50 anos.
Presidente da Casa Brasileira União Huntington, Vita Aguiar de Oliveira sabe do sofrimento de pacientes e familiares que têm que lidar com doenças genéticas, degenerativas, incapacitantes que ainda sem cura ou medicamentos desenvolvidos para aquela condição: nascida em uma família com o gene da doença de Huntington, ela já perdeu o pai, três irmãs e um sobrinho para a doença, e acompanha a luta de outros dois sobrinhos.
Em sua avaliação, a criação de um programa municipal voltado às doenças raras foi importante para familiarizar os profissionais da rede com estas condições, o que permitiu mais agilidade e um melhor encaminhamento dos casos, que, para a Doença de Huntington, normalmente envolve a prescrição de medicamentos para controlar os sintomas da doença, bem como os encaminhamentos para as equipes multiprofissionais. “A chegada de um geneticista também facilitou o fluxo de atendimento, uma vez que conseguimos chegar ao diagnóstico mais rápido”.
Geneticista atende pacientes em Hospital Dia
Todas os meses, no HD Flávio Gianotti, no Ipiranga, o geneticista Caio Graco Bruzaca Almeida Vilela realiza o atendimento de cerca de 60 pacientes enviados por unidades de saúde de toda a capital. São indivíduos – recém-nascidos, crianças, adolescentes e adultos - sem atraso no desenvolvimento, mas com suspeita de doenças genéticas e hereditárias, em busca de um diagnóstico.
Ele conta que costuma chegar a um diagnóstico clínico após uma longa consulta e uma anamnese que investiga múltiplos aspectos, incluindo todo o histórico familiar de saúde. A confirmação, porém, vem por meio do teste enviado ao Instituto Jô Clemente.
Os três diagnósticos mais frequentes dos pacientes que passam pelo HD são a doença de Huntington, a galactosemia (doença que impede o processamento do açúcar galactose, subproduto da digestão da lactose, e costuma ser diagnosticada pelo teste do pezinho ampliado) e a síndrome de Marfan (doença genética que afeta o tecido conjuntivo, causando alterações nos ossos, olhos e coração e normalmente é diagnosticada em adolescentes).
O tempo transcorrido desde o encaminhamento pela UBS até o diagnóstico e encaminhamento dos pacientes para outros equipamentos como os CERs, é de cerca de três meses. “A possibilidade de consultar um geneticista e ter acesso ao teste genético muitas vezes muda a vida dessas pessoas, que de outra forma poderiam passar anos indo de especialista em especialista sem ter um diagnóstico”, ressalta Caio.
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