Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social
Grafiteiro que viveu em situação de rua realiza intervenção artística na Vila Reencontro ‘Cruzeiro do Sul’
Texto: Lorenzo Petillo
Fotos: Lorenzo Petillo
A maior cidade do Brasil, São Paulo, abriga pessoas com muitas histórias de superação e crescimento pessoal, desde as que nasceram e viveram na capital, bem como as de outras cidades, que se mudaram para a terra da garoa em busca de uma vida melhor. Uma dessas histórias é a de Luís Eduardo dos Santos, de 28 anos, conhecido como Ludu.
Nascido em Ribeira do Pombal, na Bahia, com três meses de vida mudou-se para São Paulo com sua mãe que, pouco tempo depois, o deixou com a avó materna.
Ludu morou com sua avó até os seis anos de idade. Viveu por um ano nas ruas e passou dez anos acolhido no abrigo 'Casa Serena'. Hoje, Ludu é formado em Artes, realiza trabalhos de grafite pela cidade e dá aulas em oficinas de grafite do Projeto Quixote, na região da Vila Mariana, zona sul de São Paulo. O artista tem o sonho de estudar Artes em outros países.
Ludu fez parte do coletivo de 12 grafiteiros que realizou intervenções artísticas na Vila Reencontro ‘Cruzeiro do Sul’, na zona norte de São Paulo, na primeira semana de dezembro. O espaço possuí casas modulares para acolher famílias que estão em situação de rua ou de vulnerabilidade social.
De maneira lúdica, as artes retratadas por Ludu no espaço demonstram sua trajetória de vida antes mesmo de ele viver em situação de rua.
“Eu sempre quis manter essa ideia de imaginar. Eu vou imaginar e pintar a minha história aqui e estou fazendo um pouco do que eu vivi. Lembrei da história da carroça onde meu padrasto me levava para catar recicláveis, e as pessoas ficavam com dó. Em meio a tudo isso, eu ficava olhando os helicópteros, imaginando as cenas com brinquedos que eu ganhava na rua.”, disse o artista.
A arte do grafite na vida de Ludu
A primeira vez que Ludu teve contato com o grafite foi na Praça da Sé, região central da Capital, quando ainda vivia nas ruas da cidade. Ele ficou encantando com o trabalho de um artista que grafitava no local, enquanto os outros garotos do grupo não se interessavam muito pelo que estava acontecendo ali.
“Eu estava na Praça da Sé, tinha uma banca de jornal e um homem grafitando lá. Eu estava sentado com um refrigerante na mão e olhando o rapaz pintar. Tinham outros meninos comigo, mas eles estavam brincando e eu prestando atenção. Desde então, comecei a olhar mais para a cidade. Eu não sabia ler, mas todas as figuras repetidas que eu via, como por exemplo um rosto meio roxo, se eu visse em outro lugar, já sabia que seria o traço e as cores de um mesmo grafiteiro. Foi aí que comecei a entender mais sobre esse estilo de arte”, comentou.
Antes do grafite, Ludu assistia aulas de desenho, e teve o primeiro contato, na prática, com essa arte quando tinha apenas 14 anos e foi convidado por um colega, também acolhido no mesmo abrigo, para conhecer o Projeto Quixote. Neste projeto, o grafiteiro permaneceu até os 18 anos e aprendeu, entre outras muitas coisas, que cada artista possui seu estilo próprio.
“Depois que eu entrei no Projeto Quixote, eu comecei a estudar a identidade visual que todo artista possui. Desde então, entendi que, por mais que seja diferente e as pessoas digam que é estranho, é o estilo do artista e só ele faz exatamente daquele jeito. Muitas vezes você reconhece o artista pelo traço e eu quis construir isso através do grafite”, completou.
Malabares
Aos sete anos, quando já morava com sua avó, Ludu fazia malabares nos semáforos da capital para garantir o sustento de casa. Foi quando conheceu um grupo de meninos que vivia em situação de rua e após alguns dias convivendo com os jovens, decidiu fugir de casa e viver nas ruas.
“Nessa de fazer malabares, eu conheci uns colegas, de rua mesmo, que viraram meus amigos depois. Um certo dia me convidaram para jogar fliperama. Minha avó ficava me observando fazendo malabares, mas neste dia ela não estava e resolvi ir com os garotos achando que uma horinha não ia dar diferença. Fiquei uma, duas, três horas, um, dois dias, fiquei um tempo direto na rua e minha avó doida atrás de mim me procurando. Era a sensação de liberdade. Eu sempre gostei e respeitei demais minha avó, mas esse lance de não ter ninguém mandando em mim era o que eu queria”, relatou Ludu.
O grupo de meninos realizava furtos e arrastões na região da Praça da Sé, além de usar de violência física contra outros integrantes do grupo que não quisessem seguir a ordem dos mais velhos.
Ludu deixou o grupo quando começou a sofrer retalhação por se recusar a usar drogas, o que gerou revolta do grupo. Certo dia, se escondeu atrás de uma mulher que entregava alimentos às pessoas em situação de rua na Praça da Sé. Tia Lu, como Ludu se refere a ela foi quem o levou ao extinto abrigo ‘Casa Serena’, na Pompéia, zona oeste de São Paulo, onde morou entre os sete e 17 anos.
O abrigo acolhia jovens até completarem 18 anos. Quando Ludu atingiu a maioridade, foi adotado por uma funcionária do abrigo, que o conhecia desde os nove anos. Ele a considera sua mãe e até hoje vive na mesma casa, na região da Pompéia, junto com seu irmão adotivo. Ambos viviam juntos no abrigo desde os sete anos e foram adotados pela mesma mulher.
O grafiteiro que conhece as ruas pelas dores e pelas cores, está em processo jurídico para colocar o sobrenome de sua mãe adotiva, o que para ele será mais uma vitória, dentre as muitas que já obteve ao longo de toda a sua vida, rica em experiência, aprendizados e ensinamentos.