Controladoria Geral do Município
Entenda como foi desmantelado o esquema que desviou R$ 500 milhões do ISS-Habite-se
Considerado um dos maiores escândalos de corrupção da história do município, o esquema de desvio de recursos do ISS-Habite-se foi revelado no dia 30 de outubro de 2013, quando foi deflagrada a Operação Necator. A operação resultou na prisão de Ronilson Ferreira Rodrigues, subsecretário da Receita Municipal entre 2009 e 2012, Eduardo Horle Barcellos, ex- diretor do Departamento de Arrecadação e Cobrança, Luis Alexandre Cardoso de Magalhães, agente de fiscalização, e Carlos Augusto Di Lallo Leite, ex-diretor da Divisão de Cadastro de Imóveis (Luís Alexandre Cardoso Magalhães foi libertado no dia 4 de novembro de 2013, após assinar um acordo de delação premiada. Ronilson Bezerra Rodrigues, Eduardo Horle Barcellos e Carlos Di Lallo Leite do Amaral foram soltos no dia 9 de novembro de 2013).
De acordo com as investigações, os servidores da Secretaria Municipal de Finanças recebiam propina de 410 construtoras e incorporadoras para reduzir o valor do ISS e do Habite-se pago na conclusão de obras de grande porte.
As investigações duraram cerca de sete meses e contaram com o apoio da Secretaria Municipal de Finanças e dos membros da Agência de Atuação Integrada contra o Crime Organizado, que conta com a participação, entre outros, da Secretaria de Estado de Segurança Pública, da Polícia Civil e da Polícia Federal.
A operação, realizada nas cidades de São Paulo e Santos e no estado de Minas Gerais, mobilizou mais de 50 agentes da Controladoria Geral do Município, do Ministério Público do Estado de São Paulo e das Polícias Civis de São Paulo e de Minas Gerais. Também foi determinado pela Justiça o sequestro dos bens dos envolvidos e das empresas por eles operadas.
Estima-se que, em decorrência da ação da organização criminosa, tenha havido um prejuízo potencial para os cofres do Município de São Paulo que pode chegar a R$ 500 milhões.
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Análise patrimonial foi o ponto de partida para a identificação do esquema
As investigações tiveram início a partir da análise da evolução patrimonial dos servidores da Prefeitura de São Paulo, conduzida pelo setor de inteligência da Controladoria Geral do Município. A análise resultou em uma relação de servidores que precisariam trabalhar mais de 400 anos para fazer jus ao patrimônio acumulado. Dois deles atuavam em um mesmo setor da Administração, responsável pela arrecadação do ISS para fins de emissão do habite-se de empreendimentos imobiliários recém-construídos.
Por meio de análise estatística e de produção de informações estratégicas, a Controladoria constatou que nas obras sob a responsabilidade desses auditores fiscais a arrecadação do ISS era substancialmente menor ao percentual arrecadado pela média dos outros servidores que atuavam na mesma área.
De posse de tais dados, foi acionado o Ministério Público do Estado de São Paulo e iniciou-se uma investigação conjunta com o Grupo de Atuação Especial de Repressão à Formação de Carteis e à Lavagem de Dinheiro e de Recuperação de Ativos – Gedec.
Quebra de sigilos
No curso das investigações, com as informações decorrentes da quebra dos sigilos bancário e fiscal, dos dados provenientes do sistema de inteligência financeira e das interceptações telefônicas dos investigados, autorizadas pela Justiça, foi possível ratificar não apenas a hipótese do crime de corrupção, como também toda a cadeia de comando da organização criminosa e a existência de um sofisticado esquema de lavagem de dinheiro.
Do mesmo modo, por meio do exame dos dados oriundos da quebra do sigilo bancário, o Gedec identificou a existência de diversas transferências, em valores vultosos, efetuadas por empresas construtoras e incorporadoras de imóveis na conta corrente de empresas de titularidade de alguns dos auditores fiscais investigados e de seus familiares. Na conta bancária de uma dessas empresas houve depósitos de empresas construtoras que, em somente um mês, totalizaram mais de R$ 1,8 milhões.
Outro detalhe que impressiona é que, no mesmo dia ou poucos dias após os depósitos, coincidentemente certificados de quitação do ISS eram emitidos, de modo que os empreendimentos imobiliários administrados pelas mesmas construtoras pudessem obter o “habite-se”.
Em 02 de dezembro de 2010, uma das construtoras/incorporadoras efetuou uma transferência bancária no valor de R$ 407.165,65 para a conta da empresa de um dos fiscais. No dia seguinte, 03/12/2010, a mesma empresa obteve o certificado de quitação do ISS, mediante o recolhimento aos cofres públicos municipais no valor de R$ 12.049,59, quantia cerca de 34 vezes menor que a depositada na conta da empresa do servidor.
Além disso, testemunhas foram ouvidas e confirmaram a extorsão efetuada e o “modus operandi” da organização criminosa, informando detalhes e o nome de outros possíveis agentes que supostamente também atuavam no esquema.
"Nós temos uma nova institucionalidade na cidade de São Paulo: temos uma Controladoria que confia no Ministério Público e um Ministério Público que confia na Controladoria, harmonizando o desejo de botar ordem na cidade de São Paulo. Haverá problemas futuros? Provavelmente alguém ainda arriscará para se beneficiar, mas sabe agora que existem instituições mais fortes, mais sólidas, que vão atrás desse problema e vão procurar coibir e prevenir de toda forma a corrupção em São Paulo", disse o prefeito Haddad.
Sindicância administrativa
A partir da identificação do esquema, a Corregedoria Geral do Município, órgão que faz parte da CGM, instaurou uma sindicância para apurar as irregularidades. Em função das prisões, também foram abertos inquéritos administrativos especiais, conduzidos pelo Departamento de Procedimentos Disciplinares da Secretaria de Negócios Jurídicos, que concluíram pela demissão dos servidores, que ainda são investigados na esfera criminal - são investigados pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e concussão (utilização do cargo para a obtenção de vantagens).
Servidores envolvidos no esquema foram demitidos a bem do serviço público
No dia 28 de junho de 2014, o prefeito Fernando Haddad determinou a demissão, a bem do serviço público, dos quatro servidores envolvidos no esquema.
As demissões foram fundamentadas nos artigos 188, incisos III (procedimento irregular de natureza grave); 189, incisos V (lesar o patrimônio ou os cofres públicos), VI (receber ou solicitar propinas, comissões ou vantagens de qualquer espécie, diretamente ou por intermédio de outrem, ainda que fora de suas funções, mas em razão delas) e VIII (conceder vantagens ilícitas, valendo-se da função pública); 178, incisos III (desempenhar com zelo e presteza os trabalhos de que for incumbido), XI (estar em dia com as leis, regulamentos, regimentos, instruções e ordens de serviço que digam respeito às suas funções), XII (proceder, pública e particularmente, de forma que dignifique a função pública; e 179, caput (É proibida ao funcionário toda ação ou omissão capaz de comprometer a dignidade e o decoro da função pública, ferir a disciplina e a hierarquia, prejudicar a eficiência do serviço ou causar dano a Administração Pública), e inciso III (valer-se da sua qualidade de funcionário para obter proveito pessoal), do Estatuto dos Funcionários Públicos do Município de São Paulo (Lei nº 8.989, de 29 de outubro de 1979).
MP-SP denuncia 11 envolvidos no caso do ISS-Habite-se
No dia 4 de agosto de 2014, Ministério Público do Estado de São Paulo ofereceu à 21ª Vara Criminal da Capital denúncia contra 11 pessoas envolvidas no esquema de corrupção relacionado à cobrança do ISS-Habite-se.
Foram denunciados Ronilson Bezerra Rodrigues, ex-Subsecretário da Receita Municipal; Eduardo Horle Barcellos, ex-Diretor do Departamento de Arrecadação e Cobrança; Carlos Augusto Di Lallo Leite do Amaral, ex-Diretor da Divisão de Cadastro de Imóveis; o ex-agente de fiscalização Luís Alexandre Cardoso de Magalhães, e o ex-auditor fiscal de rendas municipal Amílcar José Cançado Lemos.
Os ex-agentes públicos foram denunciados por concussão, formação de quadrilha, associação criminosa e lavagem de dinheiro.
Todos – à exceção de Amilcar Cançado - já foram demitidos a bem do serviço público, em junho, após procedimento administrativo conduzido pela Prefeitura.
Também foram denunciados a esposa e o cunhado de Ronilson Rodrigues, Cassiana Manhães Alves e Henrique Manhães Alves; o contador que prestava serviços a Ronilson, Rodrigo Camargo Remesso; a mulher e a filha de Amilcar Cançado, Maria Luísa Aporta Lemos e Aline Aporta Lemos; e Clarissa Aparecida Silva do Amaral, esposa de Carlos Augusto Di Lallo. Segundo a denúncia, todos os denunciados se beneficiaram do esquema e participaram da lavagem do dinheiro obtido ilicitamente.
Arrecadação do ISS-Habite-se cresce 74% após a identificação do esquema
Após a identificação do esquema, o valor arrecadado pela Prefeitura de São Paulo com o ISS-Habite-se teve um aumento de 74% em relação ao arrecadado em 2012, último ano de atuação do grupo.
Para evitar novas fraudes, a Secretaria Municipal de Finanças reformulou procedimentos e adotou uma série de medidas, como a informatização do processo. Com isso, em 2014, a arrecadação com o ISS atingiu R$ 63 milhões.
Além disso, a secretaria notificou 689 empreendimentos suspeitos de terem recolhidos valores inferiores mediante pagamento de propina aos fiscais. Foram lavrados autos de infração que superam R$ 33 milhões.
IPTU
Durante as investigações também foram encontrados indícios de que os fiscais ofereciam às mais de 900 empresas do setor da construção civil beneficiadas pelo esquema uma espécie de “combo”. Além de recolher, em média, apenas 10% do ISS devido, as empresas corruptoras também poderiam lançar áreas construídas inferiores às reais e assim pagar um valor menor a título de IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano).
De 73 empreendimentos vistoriados pela Prefeitura até julho de 2014, 47 apresentaram indícios de irregularidade. Esses imóveis sofreram atualização cadastral, que deve agregar R$ 728.000,00 por ano à arrecadação do IPTU.
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